Foram tantas mudanças na minha vida,que passei anos sem frequentar a feira da minha rua aqui em Sampa. Por inúmeros motivos que a vida traz,deixei de frequentar a feira que me serviu por tantos anos,quando meus filhos eram pequenos. Toda sexta feira de manhã,eu passava de barraca em barraca,buscando frutas,legumes e verduras para semana toda. As vezes levava pastel com garapa para a molecada.
Meus filhos frequentavam essa feira desde pequenos,porque iam comigo dentro do carrinho quando eram bebes,e mais tarde andando comigo de mãos dadas. Criança gosta de feira e se diverte,porque sempre tem coisas interessantes para as mães comprarem: laços,fitinhas,fivelas,bexigas,bijuterias,bolas,etc…
O tempo seguiu seu curso,meus filhos cresceram,a vida mudou, e a feira ficou esquecida em algum lugar do passado.
Nesta semana,resolvi dar um pulo até a feira em busca de pastel ( almoço rápido e garantido ) para substituir o arroz com feijão. Bateu saudade do pastel de feira,que por muitos anos me quebrou o galho no passado.
Fiquei tanto tempo afastada da feira,que notei o quanto as coisas podem mudar com o passar dos anos. Percebi que a feira,sofreu uma metamorfose impressionante. Ficou mais curta,bem mais afastada do meu prédio,com poucas barracas e quase nada de bijuterias e brinquedos.Ou seja…a feira encolheu…murchou.
As barracas de pastéis continuam firmes,mantendo o burburinho alegre de gente feliz. Mas notei que os feirantes não gritam tanto como antigamente no ato de oferecer suas mercadorias. São mais discretos,menos teatrais.
Dei falta da barraca de peixe,sempre tão procurada e notada,inclusive por causa do cheiro.
- Estão descansando da Páscoa,disse o homem da batata. Essa semana eles não vem.
Então me lembrei de um passado distante,quando aquele peixeiro de avental branco,se aproximou de mim, com minha filha de dois aninhos no colo.
- É essa a menininha que a senhora procura ? Estava na minha barraca, passando a mão nas escamas do pintado e brincando com os bigodes dos camarões,enquanto a senhora continuou andando e foi embora.
Eu já havia corrido a feira inteira gritando feito louca o nome da minha filha,e já estava a ponto de desmaiar,quando o Santo Peixeiro apareceu com Ana Candida no colo. Pela primeira vez na vida,abracei um homem inteiro lambuzado de peixe,da cabeça até os pés. Até hoje,cheiro de peixe me remete a dualidade de emoções : alívio e esperança de noticias auspiciosas,misturado com sensação de angustia e desespero.
Agora…sentada aqui, na barraca de pasteis,depois de tantos anos passado ( mais de vinte ) me lembrei dos momentos felizes e angustiantes vividos no burburinho dessa feira.
Decidi que semana que vem volto aqui,mas não apenas para degustar pastéis. Quero voltar para caminhar em paz,sem pressa,sem medo de perder a filha ( hoje com 32 anos ) e sem medo de sentir medo ao caminhar ( sintoma de uma síndrome de pânico que me imobilizou os movimentos por tantos anos ).
O tempo passou,meus filhos cresceram,eu envelheci…mas a feira da rua ( mesmo com poucas barracas ) continua com cheiro e sabor de vida,com pessoas sorridentes e falantes,acenando com a promessa de um futuro tão gostoso,como pastel com garapa.
*PenhaBoselli*/ 2105